Comunicado de Imprensa conjunto da ªt e do Movimento Panteras Rosa- Sábado, Fevereiro 25, 2006
ASSASSINATO DE GISBERTA DO CRIME, DO ÓDIO, DO BRANQUEAMENTO EM CURSO, DA NOSSA CÓLERA!
O padre Lino Maia, presidente da União das IPSS, afirmou ontem que os rapazes teriam "circunstâncias atenuantes", porque um seu colega andaria a ser assediado por um pedófilo. Perante um assassinato, a Igreja tenta culpabilizar a população LGBT, associando-a à pedofilia. Declarações que só reforçam a convicção da motivação discriminatória. Este padre tenta desculpabilizar a instituição que dirige e os jovens à sua guarda: ao dizer que os rapazes fizeram “justiça pelas próprias mãos” por um alegado episódio não-relacionado com a vítima, está precisamente a definir um crime de ódio.
"Como foi possível?", pergunta o jornal Público de ontem. “Como foi possível que ainda não tivesse acontecido?”, respondemos. Ou não conhecemos o sistema de protecção de menores que mais não é que a continuação do abandono e dos maus tratos? Não sabemos da violência da exclusão social e de como é promovida? Não sabemos da discriminação dos sem-abrigo, seropositivos, prostitut@s, homossexuais, ciganos, imigrantes e particularmente trans, que até na comunidade gay são fortissimamente excluíd@s?
No Público lê-se "acção mais inconsciente que premeditada". O que há de inconsciente e não premeditado no insulto transfóbico e na agressão continuadas por quatro dias, no extremar progressivo da violência, na tortura e sevícia sexual? No atirar de um corpo a um poço sem verificar efectivamente se estava com vida?
É vergonhoso que ainda hoje os media desconheçam a diferença entre transexual e travesti, homofobia e transfobia, orientação sexual e identidade de género. Os jornalistas deviam questionar seriamente a sua consciência profissional, os seus próprios preconceitos, a abordagem mediática à questão dos direitos LGBT, com particular incidência sobre a população trans, a mais gozada, desfavorecida, desprotegida e incompreendida no universo mediático e na sociedade.
Parte da comunicação social referiu apenas: "sem-abrigo". Não cabe aos jornalistas - nem a ninguém - decidir se foi a característica "sem-abrigo" – ou outra - o que pesou. Infelizmente, coube ao preconceito. Gisberta acumulava exclusões, nenhuma delas pode ser omitida. Transexual que era, e vítima da transfobia. Muito mais do que enumerá-las todas, omiti-lo é esconder prováveis elementos explicatórios e querer atribuir ao crime, sem informação que o sustente, uma ou outra motivação. É, mesmo que não queira sê-lo, manipulação grosseira e reforço da discriminação.
É escandaloso o silêncio dos partidos e responsáveis políticos, mesmo com o argumento previsível de que não será evidente falar-se em "crime de ódio" com menores envolvidos. A questão não está em criminalizar "crianças" de menor idade. O Estado que assuma as responsabilidades que nunca assumiu sobre as que são "crianças". Que puna quem tem idade para ser responsabilizado. Mas não se confundam "crianças" com "jovens", e, não esquecendo a idade dramática de parte do grupo, não se desculpabilize o crime e o preconceito em si. Os sentimentos que geram o ódio são da responsabilidade dos adultos e de quem dirige o país.
Não nos perguntaremos se as crianças são capazes de odiar. A sociedade portuguesa odeia, e é nela que as crianças crescem. O ódio anti-lgbt e não só, especificamente a transfobia, é um problema social grave que se reproduz entre gerações. A questão só está e só pode estar nas medidas de combate e PREVENÇÃO das discriminações e desigualdades no seu conjunto. No caso LGBT, no reconhecimento de igualdade e legitimação social. Sim, desta vez, foram "jovens". Mas as agressões transfóbicas e homofóbicas em Portugal aumentaram nos últimos dois anos, não foram cometidas por jovens, e a regra tem sido o silêncio e o esquecimento.
E da próxima? Esperaremos por um novo crime de ódio, cometido por adultos, para tomar posição? Para agravar na Lei (não em função da idade) os crimes e as discriminações com base na condição social, estado de saúde, transfobia, homofobia, etc? Para implementar a Educação Sexual nas escolas, educando contra os preconceitos? Para enfrentar o inferno que é o sistema de (des)protecção de menores? Para investir em políticas de igualdade?
Movimento Panteras Rosa – Frente de Combate à Homofobia
ªt. - Associação para o Estudo e Defesa do Direito à Identidade de Género
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