Iniciou-se com o anúncio da organização de (mais) um grupo de trabalho sobre Transexualidade na ILGA (ou qualquer coisa deste género, perdoem a imperfeição dos termos mas a gente comum como eu não tem acesso à gravação feita no debate, portanto é tudo de memória). Depois veio a apresentação da mesa e a leitura das reivindicações pelos representantes da ILGA. Seguidamente deu-se início ao debate. Ou melhor, ás críticas da equipe do HJM ao documento, que a ser assim ficaria reduzido a menos de um terço.
Ora bem, muitas das críticas têm a sua razão de ser e concordo com elas, bem como quase tod@s @s Transexuais com quem falei. Realmente havia lá muita coisa que não faz sentido, e aqui faço notar como teria sido importante ter havido mais trabalho no documento. Se não tivesse sido trabalhado a portas fechadas, quase como que em segredo (uma estupidez visto ser um documento que diz respeito a TOD@S @s Transexuais, não exclusivo d@s Trans da ILGA Portugal), de certeza que teria aparecido muito mais razoável. Nesse sentido e mais uma vez, no final do debate lançei o repto de haver encontros entre as pessoas interessadas para debater o documento. Como fiz notar, não era ali, com limites temporários e com discussões que se afastaram um pouco para outros lados, que se poderia fazer um trabalho produtivo. Ou então, que o debate se prolongasse por mais umas boas horas, de maneira a dar oportunidade a quem o quisesse de falar de sua justiça. Coisa que se torna impraticável com limites temporários.
Já Eva Russo, representante da Opus Gay, pediu que as restantes associações também pudessem debater o documento, coisa que sou absolutamente a favor, para ver se aparece um documento único que reúna TODA A GENTE, não só a posição de uma minoria de pessoas pertencentes à ILGA Portugal.
Continuando, quando começou o debate, ou seja, quando supostamente as pessoas presentes poderiam falar de sua justiça, contestei a necessidade de uma segunda avaliação nos moldes em que é feita em Portugal (desde um mínimo de duas consultas até um máximo que ainda não sei onde termina, no meu caso, uns com testes psicológicos, outros sem esses testes, é à vontade do freguês). O Dr. Pedro Freitas do HJM, contrário a esta posição, nem me deixou explanar as minhas razões, coisa que detesto, pois quando digo algo, digo-o PORQUE tal e tal, ou seja, digo-o FUNDAMENTADO. É de lamentar que num debate nem se deixe apresentarem-se razões. Foi uma atitude rude e prepotente de um conceituado médico, coisa que sinceramente não estava à espera. Assim sendo, os restantes comentários ficaram na gaveta, não disse mais nada até ao fim, onde propuz o debate de que falei anteriormente
Já agora aproveito para dizer o seguinte: as razões para não acreditar numa necessidade de uma segunda opinião já as disse atrás, só faltou dizer que, para essa avaliação ter alguma credibilidade, cada Transexual teria de fazer dois processos em simultâneo, o que seria estúpido, no mínimo. Não me parece que seja com duas consultas, como acontece em alguns casos, ou mesmo com seis que se fique a conhecer suficientemente bem uma pessoa. As equipes médicas que nos seguem fazem-no durante o tempo suficiente para que o seu diagnóstico seja o mais credível. Assim, continuo a contestar a necessidade de uma segunda opinião
Outra coisa que me foi apontada pelo Dr. Freitas foi que não devíamos pedir muito, só o que se achar correcto. Esquece-se o Dr. que em Portugal, (e não só), para se obter 10 tem que se exigir 50. Faz parte do senso comum e é por isso que existem negociações. Logo, não concordo em absoluto com a necessidade de se exigir o mínimo, aliás, penso mesmo que se deve exigir o máximo. E outra coisa, lá porque a Espanha tenha neste momento a mais avançada lei de identidade de género, isso não implica que mesmo essa lei se possa melhorar. Não temos de pedir menos, nem sequer igual, só por estarmos em Portugal (outra boca que me amandou e à qual não pude dar resposta). Quando o Dr. afirmou que por ele se fazia copy/paste da lei espanhola, eu acrescentaria que também se deveria importar o Zapatero, pois sem dúvida nenhuma a lei só saíu por existir um Zapatero em Espanha. Sem ele, sem um político que cumpre o que promete, se calhar ainda teriam de esperar mais 30 anos em Espanha.
O resto do debate foi (salvo uma ou outra intervenção esporádica) um monólogo entre a mesa/ILGA e a mesa/HJM. A coisa aqueceu, e demonstrou as divisões existentes no Serviço Nacional de Saúde, quando se falou da inutilidade da autorização da Ordem dos Médicos (também iria falar nisso, se não me tivessem cortado a palavra). Os representantes do HSM e do HJM quase que se "pegaram". No entanto ficou-se a saber que também o Dr. Xavier do HSM é contra esta necessidade, sendo no entanto o coordenador na Ordem de quem analiza os processos. No comments. Nota curiosa: quando foi contestada a necessidade da Transexualidade estar incluída nas psicopatologias, que os representantes do HJM concordaram que efectivamente o deve estar, o Dr. Xavier Vieira (numa altura em que apareceu o exemplo da homossexualidade) disse que estava de fora das psicopatologias "quer dizer, está mas vejamos, ainda está a ser estudada". Não foram estas as palavras exactas, nem posso reproduzir aqui as hesitações, mas o que deu a entender foi que a homossexualidade saíu das psicopatologias mais por força de lobbies que por outra coisa. Ou seja, que apesar de não estar incluída oficialmente, está-o subrepticiamente. Também no comments.
Também muitas das reivindicações lá inseridas eram absurdas, pois demonstram quase um medo de que algum dia alguém descobrisse a Transexualidade de uma determinada pessoa (leia-se qualquer um/a de nós). Aquilo de mudar de nomes familiares era completamente absurdo, além de sair do âmbito da Transexualidade (qualquer pessoa pode querer fazer isso, não tem a ver com Transexualidade, bolas). Não sejamos paranóicos, deixemos as manias de perseguição de lado, não acredito que futuramente venha a haver um SIS que ande a vasculhar quem é Transexual para fazer, sei lá, uma denúncia pública? Chantagem? Quer dizer, já é um exagero. Ser-se Transexual pode não ser motivo de orgulho de ninguém (se o fosse, as pós-op não "desapareciam"), mas também não é motivo para se ter vergonha.
Resumindo, saímos de lá com a sensação de que ainda muito há a fazer em relação a este documento, e com a esperança de que TODA A GENTE INTERESSADA possa dar um contributo positivo para unir em torno deste documento uma comunidade que, além de ser a mais pequena, é também uma das mais divididas.